- Já não tenho nada. Nada. Absolutamente nada.
- …
- Já não tenho um corpo para viver. Para poder viver.
- O problema não é o teu corpo.
- Não é?! Já olhaste bem para mim? Por acaso já reparaste
que não me consigo mexer? Já viste este pedaço de merda que me tornei? Já reparaste
que este não sou?
- O teu problema não é o teu corpo. O teu problema é
nunca teres aprendido a viver para além dele. Para ti sempre foi mais
importante uma ejaculação do que uma boa conversa. Sempre preferiste aquilo que
é mais fácil, por isso tudo o resto era apenas um apêndice que de vez em quando
servia para alguma coisa.
- ...
- Pois bem, agora é ao contrário. Os papéis
inverteram-se. A tua personalidade é tudo o que te sobra e o teu corpo é apenas
um parasita que consome a tua carne e a tua esperança.
- Talvez tenhas razão… mas não estás completamente certa.
- Não?
- Não. Estás errada quanto à esperança. Já há muito que a
perdi, por isso nada resta dela para ser consumido.
- …
- Mas não tenhas pena de mim… Não te atrevas a ter pena
de mim! Porque nisso fui vitorioso! Fui eu quem ganhou essa batalha! Acabei com
ela antes que a roubassem ou que também ela acabasse comigo.
- Eu não tenho pena de ti. Tenho amor por ti.
- …
- …
- Ao acabar com ela ganhei alguns segundos. Sabes o
quanto é importante alguns segundos quando se está a morrer? Não sabes… mas
são. Realmente, são.
- Sei.
- Não sabes. Não podes saber. Não estás a morrer.
- Estou. Estou a morrer por ti o quanto tu estás a morrer
de mim. Por isso sim, sei. Sei à minha maneira, tal como tu sabes à tua.
- Que grande ironia da vida quando um par ou dois de
segundos se tornam tão importantes quanto umas gotas num deserto só porque o
final da linha está bem diante de nós.
- …
- Um par ou dois de segundos que na semana passada
desejava que passassem a correr por mim e agora dava tudo para os ter. Que
macabra é esta triste ironia de querer viver e não puder.
3 comentários:
Este discurso está qualquer coisa!
«Que grande ironia da vida quando um par ou dois de segundos se tornam tão importantes quanto umas gotas num deserto só porque o final da linha está bem diante de nós». Adorei esta parte
Beijinhos*
Precisamente, só participa na praxe quem quer. O problema são mesmo aquelas pessoas que não têm respeito pelo traje, pela tradição e pelos outros, mas isso não é culpa da praxe, é culpa da falta de caráter.
Não tens que agradecer :)
Beijinhos*
Bem... impressionantes as tuas palavras!
http://agatadesaltosaltos.blogspot.pt/
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