terça-feira, maio 7

Sem resposta (1)

Pedro há muito que já não era o mesmo. Há muito que o homem pelo qual Filomena se apaixonou havia tropeçado no abismo.
O olhar que um dia a cativara, quando o viu pela primeira vez, era agora um olhar sem brilho. Filomena era agora olhada pelo olhar de homem que carrega o mundo às suas costas, olhar vazio, olhar no qual o seu grande amor já não está lá. Também o seu sorriso deixara de ser um doce conforto. Todo aquele corpo refletia esforço, o esforço penoso que Pedro fazia para continuar agarrado àquela matéria que não lhe dizia mais nada. Filomena sabia. Ela sabia que a distância que os separava naquele momento era muito mais do que os vinte centímetros de madeira. Sentia-o a escapar-lhe por entre as mãos, mesmo tentando ela agarrá-lo com toda a sua força humana.
Ele já não era o mesmo por quem ela se apaixonou, mas continuava a ser ele quem ela amava.
Filomena sentia saudades de ouvi-lo, mas Pedro fora envolvido por um voto forçado de silêncio. Cada dia era mais um dia somado à, agora, ténue, lembrança de ouvi-lo chamar o seu nome. Há muito que a doença levara o nome de Filomena para longe da memória de Pedro e, não se contentando com isso, agora apoderara-se do corpo dele. O tempo foi-se somando ao tempo, mas o tempo já não lhes servia para nada. Pedro foi-lhe roubado implacavelmente pelo tempo que teimava em passar e no qual nenhum deus interferiu ao longo de todas as suas preces.  Mas a dor de Filomena não era dor de quem fora ignorada ou esquecida pelos céus e por Pedro. Filomena era trespassada pela dor de não ter resposta ao seu amor. Corroía-lhe não saber se Pedro se esquecera apenas do seu nome ou se também se esquecera do seu amor.
 

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