domingo, agosto 25

Ópio

Descobri ontem este tesouro de Agostinho Neto.
 
 

Ópio

Casaram-me com a tristeza!

A minha terra
negra de sol
-a minha Mãe-
que entoa magoadas melodias
em noites de festa
quando a lua ri
e a enigmática floresta
farfalha ritmos de jazz,
-a minha Mãe-
deu-me tristeza em casamento
quando nasci.

Não tive infância
nem mocidade
não tive a alegria
da primeira idade
por causa deste noivado prematuro
e senil.


Meus pesados dias são ilusões
meus prazeres amarguras
a felicidade e a vida
sonhos.


Eu próprio sou uma ilusão
Sou a irrealidade
sou sonho.


Porque a realidade é a tristeza
e não a quero assim


Para a esquecer
e olvidar meus amores
os meus ideais
fumo ópio.


Para a esquecer
e olvidar meus amores
os meus ideias
fumo ópio.


-Eu sensualizo a vida:
belo o brilho da luz
quando trabalho o sol
queimando os ombros nus
gozo o sadismo do fogo
quando danço à fogueira
e a lenha contorce
sofrendo
como o meu sofrimento
amarfanha a alma.


Gozo
gozo ingenuamente
a fingir que não sofro;
choro como quem ri!


Fumo o meu ópio
Para sonhar

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