quarta-feira, janeiro 16

Finais felizes

O típico "e viveram felizes para sempre" é uma grande venda de veludo, é areia atirada aos olhos. Os finais felizes são uma paródia da vida e acreditar neles é a mesma coisa que acreditar que as nuvens são feitas de algodão. Porque é que a verdadeira e crua felicidade está predestinada a surgir só no fim? Porque não no início ou a meio? Porque é que "no fim vale sempre a pena"? Porquê só no fim? 
O que começa, um dia terminará. Um coração que bate, um dia parará. Um sonho que se idealiza, um dia se concretizará. É tudo uma questão de "um dia...". Um dia vou-me embora de vez. Um dia vou pedir-te desculpa. Um dia vou dizer que te amo. É "um dia" infindável ao qual os finais felizes não resistiram. As pessoas estão demasiado cansadas, demasiado esquecidas. Já ninguém coloca as cartas sobre a mesa, já não se arrisca, já não se luta, já ninguém chora. O "tudo ou nada" morreu. Agora, é tudo uma questão de meios termos. Já não é um "sim" ou um "não", é um "sim" ou um "não" disfarçados de "talvez". O "sim" passou a ser temporizado e a estar em constante metamorfose semântica.
Os finais felizes já não existem. Eles exigem demasiado... demasiado trabalho, demasiado altruísmo, demasiada humildade, demasiadas pedras no caminho, demasiado céu, demasiadas estrelas, demasiado disto, demasiado daquilo. Ou se não exigem, é demasiado fácil, demasiado sem graça que arranjam-se mil e umas desculpas para adiar. E, é assim, que entregamos a felicidade de mão beijada, como se ela fosse assim tão fácil de encontrar - até parece que ela mora já ali ao dobrar da esquina (se calhar, mora). Que mania a nossa de ser tão comodistas e querer ir sempre pelos atalhos, os que têm menos montanhas e menos curvas, os que despendem menos tempo, os que doem menos. Mas, resumindo, é isto - os finais felizes estão mortos e enterrados.
Temos tanta pressa em querer fazer e ser tudo ao mesmo tempo que deixamos de ter paciência, deixamos de acreditar e matamos o "para sempre".

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